Rafael Borges
No final do ano
de 2012 o diretor da Unesp Franca, Professor Fernando Fernandes, publicou uma
portaria instaurando uma sindicância contra 31 estudantes. O objetivo de tal
procedimento administrativo seria apurar os fatos ocorridos durante uma
manifestação organizada por mais de 200 pessoas da comunidade acadêmica local
contra a presença no campus de D. Bertrand, porta-voz da extrema-direita brasileira
e integrante de grupos que pregam o ódio. Mostraremos aqui, independentemente
do juízo de valor que cada um faça sobre a manifestação ocorrida em Agosto de
2012, que a referida sindicância carece de legalidade desde o seu nascedouro e
que a Administração da Faculdade, na pessoa do seu diretor Fernando Fernandes,
violou constantemente os mais elementares princípios e garantias processuais
asseguras pela legislação pátria.
Apuração ou Inquisição?
Em primeiro
lugar é preciso destacar que não há nenhuma explicação plausível para a escolha
dos 31 nomes da Sindicância. É de conhecimento geral, conforme mostram as
imagens, que mais de 200 pessoas participaram do ato contra o “príncipe
herdeiro”. Todavia, apenas uma pequena parcela foi incluída na sindicância e
está ameaçada de sofrer algum tipo de sanção. Em várias ocasiões, o diretor,
que “coincidentemente” é o orientador do grupo que organizou a atividade com D.
Bertrand, confirmou que os nomes foram apontados pelos próprios membros do
grupo que organizou a palestra. O diretor, se afastando das suas atribuições de
administrador do campus e representante de toda a comunidade acadêmica, e se
mostrando verdadeiro militante da causa dos grupos de extrema-direita do
campus, acatou de prontidão a lista de nomes encaminhada, sem qualquer apuração
prévia. A maneira como as pessoas foram apontadas para a sindicância foi tão
precária que algumas pessoas da lista sequer estavam na faculdade no dia do
ato.
Imediatamente, o
Diretor montou uma comissão processante formada por professores indicados por
ele mesmo (!). Ou seja, o próprio orientador do grupo se torna o acusador e
este, por sua vez, indica os nomes daqueles que irão decidir sobre o caso. Importante
lembrar que os professores escolhidos foram cirurgicamente selecionados entre
aqueles ferrenhos defensores do latifúndio e do agro negócio, posição esta em
consonância com a visão de mundo de D. Bertrand. Além disso, a administração
também criou inúmeros embaraços para que as pessoas mencionadas na portaria
pudessem ter acesso aos autos do processo. E para referendar seu autoritarismo
o diretor ainda substituiu, sem qualquer motivo, os nomes constantes da
sindicância. O diretor do campus de Franca acusa, investiga e julga. Fenômeno
que no direito processual penal ganha o nome de procedimento inquisitivo.
A administração da Unesp, na sua sanha
repressiva e persecutória contra os estudantes que participam do movimento
estudantil, pisoteou o dispositivo constitucional que assegura os princípios do
contraditório e da ampla defesa nos procedimentos administrativos. Vale lembrar
que esses descalabros não são “privilégios” do diretor de Franca.
Recentemente, a administração do campus de Araraquara abriu uma sindicância, e
com um completo cerceamento de Defesa, expulsou sumariamente alguns estudantes
da moradia estudantil. Definitivamente, se depender dos diretores e da
Reitoria, os direitos e garantias fundamentais consubstanciados no célebre
artigo 5º da nossa Carta Magna não serão respeitados em terras
“unespianas”.
Destaca-se que,
mesmo transcorrido nove meses da publicação da portaria que instaurou a
sindicância, as pessoas ainda não foram sequer citadas para tomarem
conhecimento das acusações a qual são imputadas. Como se não bastasse as
freqüentes violações aos princípios do contraditório e da ampla defesa, a
administração do campus de Franca está fazendo com que o procedimento se
arraste indefinidamente no tempo. Desse modo, a direção, antes sequer do início
da apuração, já está punindo os estudantes formandos (já que estes estão
impossibilitados de receber o certificado e de trabalhar) e transforma a
sindicância num instrumento de disseminação de medo e ameaças contra os alunos
mais novos que pretendem participar do movimento estudantil.
Arbitrariedade: Faculdade impede que
formandos recebam seus certificados
Em meio a esse
mar de arbitrariedades, sem dúvida, uma delas ganha a atenção. A direção de
faculdade, amparada pela procuradoria da Unesp, decidiu não liberar os
certificados para os formandos que foram sindicados. Pior, forneceu um
documento discriminatório onde destaca que tais pessoas só fariam a colação de
grau com o término da sindicância. O diretor Fernando Fernandes, professor do
curso de Direito da faculdade, como já dissemos aplicou uma pena (a não colação
de grau) antes da própria apuração.
Diante de tamanha violação ao seu direito adquirido alguns alunos impetraram mandados de segurança contra esses abusos do diretor do campus. Não nos surpreendeu que tais atos da direção do campus tenham causado extrema indignação até mesmo nos frios corredores do Tribunal de Justiça de São Paulo. O Desembargador Luiz Sergio Fernandes, em julgamento do Agravo de Instrumento interposto pela faculdade, externou sua opinião da seguinte maneira:
Diante de tamanha violação ao seu direito adquirido alguns alunos impetraram mandados de segurança contra esses abusos do diretor do campus. Não nos surpreendeu que tais atos da direção do campus tenham causado extrema indignação até mesmo nos frios corredores do Tribunal de Justiça de São Paulo. O Desembargador Luiz Sergio Fernandes, em julgamento do Agravo de Instrumento interposto pela faculdade, externou sua opinião da seguinte maneira:
“A pretensão da autoridade
administrativa e da Universidade Paulista constitui-se um verdadeiro assombro
de arbitrariedade, máxime em se cuidando de um espaço público, no qual não se
pode admitir que o necessário esclarecimento das pessoas envolvidas no episódio
transborde para um exemplo estarrecedor de autoritarismo e abuso de poder.” (SÃO
PAULO, Tribunal de Justiça, AI 0069588-46.2013.8.26.0000
Rel: Des. Luiz Sergio Fernandes De Souza)
A orientação da
procuradoria da UNESP de negar a liberação dos certificados e conceder apenas
um documento discriminatório também foi duramente condenada pelo Relator do
acórdão:
“O pretendido condicionamento no
certificado “... o grau alcançado será conferido somente após o término de sindicância” ,
constitui-se, portanto, em termos singelos, pura arbitrariedade que espanta até
mesmo o Relator, que com mais de trinta anos de judicatura, vinte dos quais
judicando na área de Direito Público, ainda é capaz de se surpreender com a
criatividade de certas autoridades administrativas, quando se trata de praticar
atos arbitrários.” (SÃO PAULO, Tribunal de Justiça, AI 0069588-46.2013.8.26.0000
Rel: Des. Luiz Sergio Fernandes De Souza)
Importante lembrar que a Egrégia Congregação, instância
máxima de decisão do campus, votou, por unanimidade, uma nota de repúdio a
abertura da sindicância contra os estudantes. Contudo, o diretor Fernando
Fernandes, conhecido pela sua falta de diálogo com a comunidade acadêmica,
simplesmente ignorou esse fato e segue trabalhando arduamente para sancionar
àqueles que defendem o caráter público e laico da universidade.
Sindicância a serviço de uma política
persecutória
O que
desenvolvemos a cima apenas demonstra como a dita sindicância, contaminada
desde a sua raiz por vícios e nulidades, é, na realidade, um instrumento que a
direção se vale para gerar um constante medo contra os estudantes que almejam
participar do movimento estudantil.
Uma simples
visualização dos autos da sindicância mostra o seu verdadeiro objetivo. São
páginas e mais páginas destinadas a mostrar a predisposição política e
ideológica das pessoas, inclusive com investigações em redes sociais. Também
constam nos autos, evidenciando o verdadeiros interesse por trás da
sindicância, ofícios de grupos e partidos de extrema-direita exigindo repressão
aos envolvidos. O Diretor, lamentavelmente, tem dado mais atenção aos resmungos
de representantes da nova ARENA (o partido que sustentou a ditadura) do que a
própria Congregação do Campus. Parece que o entendimento de que tal sindicância
tem um forte caráter de perseguição também é compartilhado pelos magistrados do
TJ que julgaram recente mandado de segurança impetrado por uma aluna:
“É por essas razões que causa
perplexidade que uma universidade pública, que é um centro de excelência de
ensino e pesquisa e gerida por preparados e respeitáveis professores, venha a
resvalar em perseguições e arbitrariedades como a relatada nesse agravo.” (SÃO
PAULO, Tribunal de Justiça, AI 0069588-46.2013.8.26.0000
Rel: Des. Luiz Sergio Fernandes de Souza)
Não há mais dúvida
sobre os vícios e nulidades nessa sindicância. Também pensamos que sejam claros
os objetivos persecutórios envolvidos nesse procedimento. Diante de tamanho
absurdo, condenado até mesmo pelos desembargadores do Tribunal de Justiça de
SP, se faz necessário que a direção libere imediatamente o certificado, sem
qualquer restrição ou discriminação, para todos os alunos sindicados que já
tenham reunido as condições acadêmicas para colação de grau. Tendo em vista o
longo período que se passou sem que tenha ocorrido sequer a citação dos
envolvidos, desrespeitando assim outro princípio constitucional (CF/88, LXXVIII, a todos, no âmbito judicial e
administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que
garantam a celeridade de sua tramitação.) é preciso dissolver e encerrar
os trabalhos dessa sindicância o mais rápido possível. Com a palavra, a
administração da UNESP-Franca.