terça-feira, 30 de outubro de 2012

DETENÇÃO SEM MUROS


Não há dúvida que a justiça criminal no Brasil, assim como o sistema carcerário, é instrumento de repressão e violência contra a população pobre. Enquanto os canalhas do Congresso Nacional e do palácio do planalto saem à forra com o dinheiro público, como mostra os escândalos dos mensalões do PT e do DEM/PSDB, a população pobre, sobretudo os negros, são julgados e trancafiados anos a fio por pequenos furtos ou crimes famélicos. 
Entretanto, no Brasil de tucanos e petistas, ter um julgamento pela justiça penal já virou privilégio. A polícia agora investiga, julga e executa na hora. Em São Paulo, até agora, foram 434 pessoas assassinadas pela PM. A maior parte dessas pessoas assassinadas, como indicam alguns estudos, não tinham qualquer envolvimento com o crime organizado ou sequer tinham passagem pela polícia.
Além de tudo isso, agora São Paulo, tal como o Rio governado pelo aliado de Lula – o Cabral, tem também suas “detenções sem muro”. O governo paulista mandou sitiar algumas favelas e comunidades na capital paulista. Com toques de recolher e violência contra os moradores a polícia cumpre o seu papel: Garantir a segurança dos ricos e a repressão e controle sistemático do povo pobre e negro. 
Essa música me fez pensar sobre a situação dos bairros sitiados pela polícia assassina de Alckmin.

FORA PM DAS FAVELAS E COMUNIDADES DE SÃO PAULO!



segunda-feira, 29 de outubro de 2012

BASTA DE MASSACRE AOS GUARANIS-KAIOWÁ!



Basta de massacre aos Guarani-Kaiowá! Pelo direito à terra e território em Pyelito Kue! Apoiemos à luta dos povos indígenas como parte da luta da juventude e da classe trabalhadora contra a burguesia brasileira, herdeira do massacre indígena, do latifúndio e da escravidão!

Por Leandro Ventura ( publicado originariamente no site da LER-QI)




A carta de índios Guarani-Kaiowá acampados em um território que historicamente pertencia a sua tekoha (terra, território) Pyelito Kue (em Iguatemi-MS) ganhou os quatro cantos do Brasil. Na carta afirmam estarem dispostos a morrerem todos em defesa de suas terras ancestrais que a justiça ameaça em prol de fazendeiros. O desespero de sua situação não é uma particularidade desta localidade, mas escancara a situação de genocídio em que se encontram diversos grupos indígenas em todo o país e, particularmente, os distintos grupos Guarani. Sua decisão a resistir tem encontrado eco de diversos outros grupos indígenas e despertado setores da juventude a realizar atos em solidariedade e repúdio aos fazendeiros e seus porta-vozes.

Poucos dias depois desta carta uma nova denúncia escancarou uma outra face da brutalidade da opressão que sofrem pelas mãos dos fazendeiros e do Estado brasileiro. Uma jovem de Pyelito Kue, conforme denuncia do CIMI, foi estuprada por oito pistoleiros e depois torturada e interrogada para obterem informações sobre as lideranças de sua tekoha. Não param as denúncias de ameaças por pistoleiros, torturas e intermináveis mortes por mãos de fazendeiros nos últimos anos. Esta violência dos fazendeiros para buscar ter mais terras e matar aqueles que estão em seu caminho de obter as mesmas é uma continuação da política histórica do Estado brasileiro de espremer os guarani em minúsculas terras que não dão sequer para se alimentar e forçá-los a se tornar mão de obra barata ou simplesmente morrer para dar lugar à soja, ao gado, e a fazendas para o turismo “ecológico” no Mato Grosso do Sul.

Como denúncia de sua tragédia histórica e cotidiana, os mesmos Guarani, sobretudo os Kaiowá, tem os maiores índices de suicídio, particularmente de jovens, entre todos povos indígenas no Brasil, alcançando alarmantes 866 casos desde 2000 (para uma população de menos de 51 mil). Um índice de suicídios por habitantes que é 20 vezes maior que o índice de todos brasileiros, e para termos como comparação, é quatro vezes maior que o índice de assassinatos no Rio de Janeiro.

O órgão do governo federal responsável pela política indígena (A Funai) reconhece esta situação, definindo que os Guarani-Kaiowá vivem em “confinamento”. Em uma carta publicada em 25/10 (publicada na Carta Capital) o órgão afirma que “A Funai ressalta a gravidade da situação dos Guarani e Kaiowá, cuja população é de 45 mil pessoas distribuídas por pequenas áreas. A situação é caracterizada como de confinamento, devido à alta densidade populacional. A qualidade de vida e, especificamente, a segurança alimentar, estão associadas ao acesso efetivo dos povos indígenas ao seu território tradicional.”

Nem mesmo a FUNAI consegue esconder que o que o Estado brasileiro fez historicamente, e o que vivem hoje os Guarani, é um genocídio. Sua definição de “confinamento” nos remete a outros genocídios. Os judeus foram confinados em pogroms pelo czarismo russo, os judeus foram confinados em guetos pelos nazistas, os negros em bantustões no Apartheid sul-africano, e os guarani em minúsculas “Terras Indígenas” delimitadas pelo governo federal. Trata-se de genocídio e o Estado brasileiro é responsável.

Este Brasil do latifúndio e do trabalho precário foi e é erguido com sangue indígena sobretudo guarani



Há três traços fundamentais que definem o estado que a burguesia brasileira ergueu associada a distintos imperialismos. O latifúndio, o racismo e o trabalho precário. Para erguer este estado foi necessário exterminar grupos indígenas, confiná-los, escravizá-los e seqüestrar e escravizar os negros. A continuação e perpetuação desta política é uma herança que todos governos e distintos regimes levam adiante.

De 1500 a hoje o Brasil ergueu-se contra os índios e negros para criar este estado semi-colonial da pobreza, violência policial e imensas terras dos herdeiros das casas grande.

Para erguer o latifúndio era preciso que a terra estivesse livre de habitantes vivos ou potenciais. Os primeiros anos da colonização foram anos de extermínio e escravidão indígena, e seqüestro e escravidão negra. Os bandeirantes são louvados nas salas de aula como gente inventiva e que ergueu o Brasil. Eles de fato o fizeram. O que não se conta é que um de seus primeiros passos para “erguer o Brasil” foi a destruição entre 1628 e 1632 da missão jesuíta de Guaíra (no Paraná, município adjacente a Iguatemi-MS onde ocorre a tragédia atual da tekoha Pyelito Kue). Com a destruição desta missão os bandeirantes capturaram e venderam entre 30mil e 50mil escravos guarani1 , treinando primeiro com os guarani, o que os bandeirantes fizeram depois com a destruição do Quilombo dos Palmares em 1694-1695. Numerosas fontes falam que no final do século XVIII havia algo como 320 mil escravos indígenas no Brasil, dentre estes algo como 200 mil guarani escravizados pelos paulistas2 .

Esta é uma parte da história antiga e atual do Brasil que é apagada em nome de erguer um conto pacífico de “convivência das raças”, que esconde o massacre e escravidão indígena e negra. Apaga-se da história do Brasil as numerosas legislações de 1500 a hoje que serviram para reduzir e escravizar os índios. É deste modo que aprendemos nas escolas que não havia escravidão indígena e apaga-se da história como havia até próximo de 1800 uma legislação que permitia escravizar índios que fossem “selvagens” e “violentos”, quando era declarada uma “guerra justa” a eles. E quem declarava a “justiça” destas guerras eram as câmaras municipais, que eram a representação política dos latifundiários e estavam interessadas em mais terras3 .

O século XIX viu a mesma política ser continuada com outros meios. Para começar a dar passos para o fim da escravidão o governo imperial primeiro buscou resolver a questão das terras. Criou a lei de Terras de 1850 que instituiu e regularizou imensos latifúndios. Os negros não podiam ter acesso às terras pois deveriam ficar nas fazendas e cidades e servir de mão de obra barata. Ao mesmo tempo havia que fazer algo com os índios para que estes também não estivessem no caminho do latifúndio e pudessem ter acesso as mesmas terras. Antes de esta lei entrar em vigor, o governo imperial deu grandes passos com suas “missões indígenas e de catequese” que fizeram em escala nacional o que tinham buscado fazer os jesuítas – reduzir e agrupar os índios. Numerosos estudos mostram como as missões atendiam a dois fins: concentrar uma reserva de mão de obra em vias fluviais que fossem úteis ao comércio e abrir espaço para tomar as terras4 .

Outro capítulo sangrento do erguer da “nação brasileira” foi o que se conhece como “Guerra do Paraguai”, onde “heróis nacionais” como Duque de Caxias conduziram um genocídio dos povos do país vizinho (que não por acaso são em sua maioria guarani, e esta é uma língua oficial falada pela maioria dos habitantes daquele país).

A república, a ditadura e a “democracia” todas continuaram a política de confinamento e formação de mão de obra barata. Enquanto a “república velha” criou o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), focou-se em concentrar e armar os índios das fronteiras (novamente os guarani da tríplice fronteira tem importância), esta mesma república buscava “incorporar” os índios como mão de obra-nacional e barata. Um especialista define a política do SPI que existiu até 1967 como “de instrumentalização dos índios para o trabalho agrícola”5 .

A “democracia” atual é herdeira destas políticas. Se por um lado os governos FHC, Lula e Dilma buscaram mostrar uma outra cara e até criaram territórios indígenas como Raposo-Serra do Sol no governo Lula, por outro lado, todos estes governos das últimas décadas autorizaram o genocídio dos grupos que estivessem no caminho da expansão agrícola no centro-oeste, no caminho das grandes hidrelétricas do Norte. Agora com Dilma temos um avanço na perpetuação deste Estado, com seu Código Florestal e numerosos projetos de lei em tramitação que buscam, entre outras coisas, regulamentar como seria possível valer-se de recursos vegetais, das terras e recursos minerais em terras indígenas supostamente respeitando sua soberania.

O fim do latifúndio, do trabalho precário e barato e respeito às terras e territórios indígenas será obra da classe trabalhadora, da juventude e dos povos indígenas



A história dos índios no Brasil e de um de seus mais populosos grupos, os Guarani, é parte da história de assassinato, escravidão e confinamento, para criar latifúndio e mão de obra barata. Não será da mão dos fazendeiros e seus parceiros industriais e comerciais das cidades, nem dos governos que perpetuam esta herança do velho Brasil colonial, escravocrata e latifundiário, que mudaremos esta história. Contra esta história, e em defesa de seu próprio caminho histórico e como povo, pelo seu território, que se erguem os Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue.

É possível que com sua resistência os Guarani-Kaiowá consigam estender seu território englobando uma pequena parcela de seu território ancestral. Apoiamos esta luta. Mas sabemos que alguns hectares a mais, de certo úteis e justos, não mudarão o contexto onde se inserem estas terras indígenas, confinadas como diz a Funai. As terras indígenas enquanto houver a burguesia brasileira, herdeira da casa grande, do latifúndio e do massacre indígena, existirão em meio ao confinamento para liberar outras terras para o latifúndio e forçar os povos indígenas a vender sua força de trabalho não tendo como subsistir em meio ao confinamento e as terras degradadas e espremidas pela ação dos fazendeiros, seus pistoleiros e suas armas e seus agrotóxicos.

A luta dos povos indígenas precisa ser compreendida pelos trabalhadores e a juventude nas grandes cidades em dois sentidos. Como parte de sua luta contra o latifúndio e o trabalho precário. A derrota dos fazendeiros e do estado brasileiro no Mato Grosso do Sul será um passo para lutar contra o latifúndio e o trabalho precário em outros lugares do país. Mas também precisa ser compreendida como a decisão dos guarani-kaiowá em resistir e erguer sua própria história. Em Pyelito Kue se faz o que é impensável na história de como a burguesia brasileira pensa os índios: serem sujeitos de sua própria história.

E isto também precisamos sermos nós, os trabalhadores, a juventude, e especialmente as camadas mais exploradas e oprimidas, os negros. Sem os trabalhadores e a juventude nas grandes cidades tomarem como suas as demandas de todos os oprimidos no país não haverá uma verdadeira luta contra a burguesia no Brasil. Qualquer revolução, ainda mais uma operária e socialista, é impensável e impraticável sem os trabalhadores negros, sem os bóia-fria, sem as domésticas negras e nordestinas do sudeste e também guarani do centro-oeste.

Esta luta precisamos conduzi-la de forma independente de todas alas da burguesia brasileira e imperialista (inclusive as supostamente “democráticas” e “humanitárias”). Não será da mão de ONGs financiadas por imperialismos, nem com apelos a sensibilidade de Dilma, como tem feito o PSTU em numerosos artigos, que ergueremos uma luta que é contra este governo, a burguesia e seu Estado mesmo que passe taticamente por tal ou qual assinatura e decreto do governo. Não semeemos ilusões de que quem assina o Código Florestal tem a menor sensibilidade com os povos indígenas no Brasil. Chamamos a esquerda anti-governista particularmente os vereadores eleitos pelo PSOL e PSTU a colocar seus recursos financeiros, espaço na mídia, para a mobilização independente contra o governo, a burguesia e seu estado.

Precisamos erguer nossa história contra a burguesia brasileira acabando com o latifúndio, organizando fazendas coletivas controladas pelos trabalhadores, e distribuindo terra àqueles que desejarem. Precisamos expropriar sobre controle dos trabalhadores os monopólios brasileiros e imperialistas dos grandes recursos naturais buscando diminuir drasticamente seus impactos ambientais e colocar seus recursos a serviço de garantir saúde, educação e moradia a todos brasileiros. Será através do uso racional dos recursos naturais, da produção agrícola e industrial através do planejamento democrático do conjunto da economia pelos trabalhadores para que esteja a serviços dos indivíduos, e não os indivíduos a seu serviço, que poderemos erguer outra história. A derrota da burguesia brasileira e seu Estado mediante a auto-organização dos trabalhadores em conselhos operários para erguer um Estado operário e socialista é o que pode abrir caminho para uma nova e verdadeiramente harmoniosa e livre integração dos povos no Brasil.

1“Os Guarani e a história do Brasil meridional: séculos XVI-XVII” de John Manuel Monteiro em História dos Índios no Brasil, organizado por Manuela Carneiro da Cunha. São Paulo: Cia da Letras, 1992. pg 492

2 Instituto Sócio Ambiental, ver verbete “Guarani-Kaiowá”, disponível em http://pib.socioambiental.org/pt/povo/guarani-kaiowa/

3 “Índios livres e índios escravos: os princípios da legislação indigenista do período colonial (séculos XVI a XVIII) de Beatriz Perrone-Moisés em História dos Índios no Brasil, organizado por Manuela Carneiro da Cunha. São Paulo: Cia da Letras, 1992.

4 Ver por exemplo “Política indigenista no século XIX” de Manuela Carneiro da Cunha em História dos Índios no Brasil, organizado por Manuela Carneiro da Cunha. São Paulo: Cia da Letras, 1992.

5 “O governo dos índios sob a gestão do SPI”, de Antônio Carlos de Souza Lima em História dos Índios no Brasil, organizado por Manuela Carneiro da Cunha. São Paulo: Cia da Letras, 1992.


sexta-feira, 12 de outubro de 2012

ESPECIAL: 95 ANOS DA REVOLUÇÃO RUSSA. A HISTÓRIA DA REVOLUÇÃO RUSSA EM IMAGENS



O Blog "Adeus ao Capital", continuando sua seção especial dedicada aos 95 anos da primeira revolução proletária da História, traz aos seus leitores e seguidores o documentário "Eles se Atreveram - A Revolução Russa de 1917". Organizado pelo Instituto de Pensamento Socialista (IPS) Karl Marx e pelo grupo "Contra-Imagem" o documentário nos traz um resumo da história da Revolução Russa em imagens. Os relatos do filme estão baseados em obras e textos de Lênin, Trotsky, Rosa Luxemburgo, John Reed, Vladimir Maiakovsky, Pierre Broué e outros revolucionários. O documentário foi construído com base em uma cuidadosa seleção material de arquivos, documentos e fragmentos do cinema soviético. As imagens documentais foram utilizadas respeitando seu lugar e seu momento histórico. Neste sentido, podemos ver imagens do documentário de Esther Shub, "A Queda da Dinastia Romanov" e centenas de imagens jamais recompiladas em um único filme — a vida do Czar, as jornadas de julho, a revolução de fevereiro a outubro, a guerra civil, etc. Há também cenas de "Entusiasmo" (1930) de Dziga Vertov; "A Greve" (1924), "O Encouraçado Potemkin" (1925) e "Outubro" (1927) de Sergei Eisenstein; "Arsenal" (1928), de Alexander Dovzhenko; "Mãe" (1926) e "O Fim de São Petersburgo" (1927) de Vsevolod Pudovkin, entre outros filmes. A montagem final é complementada com animações russas e soviéticas da época, algumas muito originais.
É um excelente material para todos aqueles que querem conhecer mais sobre a história e os antecedentes desses "10 dias que abalaram o Mundo" e também um ótima ferramente para a formação de trabalhadores e jovens que despertam para a política revolucionária. 





quarta-feira, 10 de outubro de 2012

ESPECIAL: 95 ANOS DA REVOLUÇÃO RUSSA



Nesse mês de Outubro (considerando o calendário Juliano utilizado na época) completam-se noventa e cinco anos da primeira revolução operária e socialista vitoriosa da história. Os operários e camponeses do velho império russo, dirigidos pelo partido bolchevique de Lenin, Trotsky e outros grandes dirigentes revolucionários, colocaram a baixo não apenas a decrépita e feudal monarquia russa em fevereiro de 1917 como também, alguns meses depois, a incipiente e degradada democracia burguesa que setores da burguesia e “socialistas” reformistas planejavam instalar. A burguesia, que por algum tempo contribuiu na luta contra o Czar e os resquícios feudais, logo se mostrou incapaz de resolver os  velhos problemas democráticos (autodeterminação das nações oprimidas pelo império russo, reforma agrária e democracia) bem como as necessidades mais elementares da classe trabalhadora. A Revolução Russa, dessa forma, se tornou a confirmação histórica da teoria da revolução permanente, desenvolvida em seu conjunto alguns anos mais tarde por Trotsky, de que apenas a classe operária, em conjunto com seus aliados (pobres, oprimidos e camponeses) poderia, no trajeto em direção ao socialismo, resolver os grandes problemas democráticos que a burguesia, agora reacionária, já não tinha nenhuma disposição em realizá-los.


A revolução russa foi a comprovação de que o capitalismo mundial entrava numa nova fase, como apontou Lenin em 1916, onde um punhado de potências imperialistas oprimia o conjunto das nações coloniais e semicoloniais. Ademais, esse novo período, com o advento de crises econômicas, Crack financeiros e guerras Inter imperialistas com cada vez mais frequências, abria uma situação de mudanças políticas e sociais bruscas, onde a classe trabalhadora deveria intervir de maneira independência para que não continuasse pagando pelas crises e mazelas do Capital.
Além dessa nova fase imperialista, que ao longo dos textos publicados mostraremos que segue existindo, a combinação de elementos subjetivos como o desenvolvimento dos Sovietes (Conselhos Operários e Camponeses com delegados eleitos na base e mandados revogáveis) com a intervenção do partido bolchevique (ala revolucionária da velha social democracia russa) foram fundamentais para levar o proletariado ao poder pela primeira vez na história. Os trabalhadores russos, em Outubro de 1917, abriam um novo capítulo da história da humanidade, com feitos maravilhosos como o voto para as mulheres (o primeiro país do mundo a liberar), a legalização do aborto para que as mulheres pobres não morram na clandestinidade, saída da 1º guerra e tratado de paz, expropriação do latifúndio e reforma agrária, autodeterminação de todas as nações oprimidas e fim das discriminações institucionalizadas devido nacionalidade, controle operário nas fábricas e, sobretudo, um regime democrático superior a mais democrática da republicas burguesas.

Ao longo das próximas semanas o Blog “Adeus ao Capital” publicará uma série de artigos (alguns já publicados e outros inéditos) em homenagem aos 95 anos da revolução Russa. Não se trata só de uma homenagem pela importância história desse feito, mas também uma contribuição, ainda muito pequena é verdade, para por fim as falsificações históricas que a burguesia segue realizando e auxiliar a classe trabalhadora no resgate de sua própria história. A revolução russa, mesmo com sua degeneração stalinista e a restauração do capitalismo (que ao longo das próximas linhas mostraremos que não se tratava de algo inevitável), é o exemplo vivo de que a classe trabalhadora pode vencer.
O primeiro artigo que publicaremos é a uma síntese de uma das seções do seminário de estudos “O Marxismo de Leon Trotsky” realizado pelo dirigente nacional do PTS Cristian Castillo, em Buenos Aires, em março de 2012. Lamentavelmente, a revolução Russa, sobretudo os anos que se seguiram com a burocratização e o stalinismo, assim como os Estados Operários deformados que ainda perduram em nossos dias (Cuba e Coréia do Norte) são analisados majoritariamente por dois pontos de vistas igualmente errôneos. O primeiro diz respeito as concepções conservadoras da burguesia que julga tanto a União soviética burocratizada, como atualmente Cuba, como simples ditaduras totalitárias e cinicamente dizem que a solução estaria na restauração do capitalismo. Por outro lado, estão as organizações de esquerda reformistas, populistas (Consulta Popular) e semi-estalinistas (PCB) que, a título de exemplo, seguem apoiando a burocracia castrista que controla Cuba defendo-a como legítima direção revolucionária, desprezando o curso restauracionista que cada vez mais esta vem tomando, além da falta de liberdade política aos trabalhadores e às organizações revolucionárias independentes, contribuindo, dessa forma, para reforçar o próprio argumento da direita de que democracia e socialismo são conceitos contraditórios. Desse modo, julgamos importante publicar nessa primeira oportunidade esse artigo que, à Luz dos grandes combates da classe operária e da revolução russa, discute o verdadeiro significado do conceito de Ditadura do Proletariado e como esta era organizada nos primeiros anos do primeiro Estado Operário da História colocando abaixo tanto as teses dos ideólogos da burguesia quanto aos que capitulam as burocracias.

Blog "Adeus ao Capital"



A democracia soviética e o socialismo




Marx e a “ditadura do proletariado”
O conceito de “ditadura do proletariado” tem sua origem nas barricadas de Paris de junho de 1848 quando o proletariado é massacrado pelo governo republicano. Previamente, no “Manifesto Comunista”, publicado antes das revoluções de 1848, está a ideia de que a classe operária, varrendo o poder do Estado, deve transformar-se em classe dominante, mas Marx ainda não utiliza ali o termo “ditadura do proletariado”. Logo depois, em “A luta de classes na França”, explica que a derrota de 1848 deixou um grande aprendizado político: que com a conquista do sufrágio universal e da república representativa – a “emancipação política”, própria das revoluções burguesas – não se conquista a emancipação social, não se liquida a sociedade de classes, ainda que se criem melhores condições para lutar por este objetivo. A conclusão é que a classe operária tem que terminar com o aparato de Estado burguês e instalar um novo tipo de Estado, a “ditadura do proletariado”. Marx ainda não dava conta de como seria este Estado, ainda que o definisse como necessário para alcançar o socialismo e o comunismo. Esta era sua diferença central com o anarquismo, com o que coincidia no ponto de chegada a uma sociedade sem Estado, sem classes e sem dinheiro. Os anarquistas pensavam que o Estado podia abolir-se por uma mera decisão, enquanto Marx e Engels diziam que o Estado era produto de determinadas relações sociais. Sua concepção era de que o Estado burguês devia ser destruído, mas para construir um Estado proletário que se iria extinguindo à medida em que avançasse a construção do socialismo. No capitalismo, a maioria trabalhadora é explorada por um punhado de capitalistas. O Estado é um meio de dominação política e não expressão do “bem comum”. Toda sociedade dividida em classes implica que uma exerce sua ditadura sobre a outra, de uma minoria sobre a maioria. A “ditadura do proletariado” é um Estado que inverte esta ordem. A maioria mina a resistência da minoria exploradora, invertendo sobre quem se impõe o despotismo. Em termos simplificados, mas populares, como dizem atualmente os manifestantes do movimento Occupy Wall Street, para que os 99% não continuem enriquecendo mais, através das leis, parlamento e do aparato de Estado, o 1% de exploradores.



A “ditadura do proletariado” é uma dominação transitória, tem o objetivo de abolir-se a si mesma, deixar de ser um aparato de coerção social e que as tarefas administrativas vão sendo tomadas coletivamente. Um grande indicador do avanço do socialismo é se vai extinguindo este aparato. Nosso fim é o comunismo, uma sociedade sem coerção, sem guerras, que expresse a passagem do reino da necessidade ao reino da liberdade. Toda sociedade capitalista, tenha o governo ou o regime que tenha, desde o ponto de vista sociológico, ou seja, de que classe domina, é uma ditadura do capital e o Estado está a serviço de preservar o interesse dos capitalistas. O que é considerado “legal” no capitalismo? A propriedade privada dos meios de produção e de troca e a exploração do trabalho assalariado. O que é “ilegal”? A expropriação dessa propriedade. Mas, ademais deste conteúdo “sociológico”, há que ver as formas do regime político. Por exemplo: uma ditadura como a de Videla (ditador argentino) ou uma democracia burguesa. Nesta última os capitalistas dominam concedendo liberdades democráticas como o voto, o que implica um avanço em direitos políticos, mas é ao mesmo tempo um mecanismo de dominação. Porque se presta a engano: falam de soberania popular, mas todos os dias os que elegem e decidem são os monopólios e seus funcionários políticos, e um só dia, a cada 2 ou 4 anos, o povo vota, em eleições realizadas em condições favoráveis aos políticos burgueses. No capitalismo a “soberania popular” é eleger representantes para que o povo trabalhador não faça política cotidianamente. A igualdade ante a lei na sociedade burguesa encobre a desigualdade real. O operário e o burguês são iguais perante a lei, mas uns têm milhões e outros estão obrigados a vender sua força de trabalho para viver.
O termo “ditadura” tem então dupla acepção: social, porque mostra quem domina; política, porque marca a forma de dominação. Por que ditadura do proletariado? Porque à burguesia não se lhe pergunta se quer ser expropriada, mas se a expropria impondo a força da maioria. Busca-se, dessa forma, que os que viveram como parasitas espoliando a classe trabalhadora, agora trabalhem como todos.
Como seria este regime? Marx tira lições da Comuna de Paris onde as massas tomaram o poder em uma cidade: dissolve-se a polícia, um grupo de homens armados a serviço de defender a sociedade burguesa, e se a substitui pelo armamento do povo. Os policiais são guardiões do Estado burguês, encarregados de alvejar a cabeça dos operários quando estes saem a lutar. Por isso, em geral, não apoiamos suas greves que reivindicam melhores condições para exercer a repressão. Os marxistas queremos dissolver a polícia e as forças repressivas do Estado. Qualquer funcionário ganhava o mesmo que um operário médio, a mesma coisa que levantamos desde a Frente de Esquerda [Frente entre partidos da esquerda trotskista argentina para as eleições de 2011], como parte de nossa tradição socialista. Além disso, uniram-se as funções legislativas e executivas do Estado. Lênin definia que o parlamento era um lugar de “charlatanice burguesa onde se conspira contra o povo”. Se os socialistas revolucionários temos um lugar no parlamento, denunciamos estas conspirações e chamamos a mobilizar para esmagar este regime e o Estado burguês. Não temos a ilusão de que do parlamento venha a transformação; mas utilizamos este espaço como uma tribuna de agitação de massas, para ajudar o desenvolvimento de sua consciência política. Uma última questão que levanta a Comuna é a revogabilidade para aqueles que eram eleitos por parte do povo.
Ainda que a Comuna fosse derrotada dois meses depois da insurreição que lhe deu origem, foi uma experiência que assentou os princípios de um novo tipo de Estado. Uma ditadura do proletariado, baseada na democracia operária, onde os assuntos políticos do Estado estejam nas mãos das massas trabalhadoras. Onde democracias políticas e econômicas andem de mãos dadas. Quanto mais tempo alguém esteja atado ao trabalho assalariado, menos tempo terá para politizar-se e para seu desenvolvimento pessoal. Nós queremos que a classe operária se encarregue dos assuntos políticos, e para isso é necessário expropriar o capital e reduzir qualitativamente a jornada de trabalho. Como a revolução não se dá simultaneamente em todo o mundo, esse poder armado necessita resistir os embates da burguesia e do imperialismo. Quanto mais se desenvolva e avance o socialismo, mais se irão eliminando os aspectos coercitivos do estado proletário. Se o Estado operário ainda está muito presente, isso quer dizer que o avanço do socialismo é ainda débil. Avança-se mais para o socialismo quanto mais as condições de coerção sejam desnecessárias. Por isso, os marxistas falamos da destruição prévia do Estado burguês, e a extinção posterior do Estado operário. Nosso fim não é uma sociedade estatista, mas uma sociedade sem Estado. É liquidar toda forma de opressão; e com isso, eliminar a violência, as guerras. Aspiramos a uma sociedade baseada na fraternidade humana, como dizia Marx: uma sociedade de produtores livremente associados, o comunismo.

A revolução russa e os sovietes



A forma de ditadura proletária mais acabada na história foram os primeiros anos da Revolução Russa. Nos soviets ou conselhos operários se votavam delegados: por local de produção, os operários; os soldados nos quartéis; e os camponeses por território. Vedavam-se os direitos políticos aos exploradores. Esta limitação de direitos políticos se fazia, sobretudo, para exercer controle sobre os camponeses ricos que dispunham de força de trabalho sob seu serviço.
Que tem de novo a democracia soviética? Assimila da Comuna a dissolução das forças repressivas do Estado e o povo armado; assimila que todo funcionário político é eleito e revogável, e cobra o mesmo que um operário médio; ademais, organiza-se em base, não mais do sufrágio universal, mas por local de produção. Isso é a “democracia soviética”. O homem e a mulher decidem, mas em base ao que são na sociedade. A decisão e a deliberação não são somente sobre assuntos políticos em geral, senão também sobre o que compete à planificação econômica. As massas no poder dirigem os assuntos políticos e econômicos. Para isso precisa-se expropriar o capital, já que se necessita do manejo dos meios de produção para planificar a economia. Nós pensamos uma economia planificada democraticamente, sem necessidade de uma burocracia que imponha uma determinada planificação, como fez o stalinismo; ou uma classe que mova a economia em seu benefício às custas da vida operária, como no capitalismo. Assim, mediante a planificação democrática dos recursos econômicos, poder-se-ia terminar com os flagelos do capitalismo, estabelecendo uma escala de prioridades a satisfazer, decidida democraticamente.

A burocratização da União Soviética


Isto tudo não pôde desenvolver-se plenamente na União Soviética devido à burocratização do Estado operário. Uma casta parasitária se impôs no poder. Stalin foi a direção desse processo. O livro “A revolução traída” é um grande trabalho de Trotsky sobre a burocratização da URSS, escrito em 1936, quando o processo estava consolidado. Nunca a burocratização se dá em um ato, nem é uma inevitabilidade ou uma impossibilidade, a burocratização depende dos ritmos de desenvolvimento da revolução mundial e da escassez ou abundância de recursos econômicos da sociedade. De onde surge o burocrata, diz Trotsky? Da escassez, se as pessoas têm de fazer fila para o pão, há um “fiscal” que organiza a fila. O “fiscal” já é o início da burocratização. Recebe algo adicional por ser o parasita que ordena a fila. Que é a burocracia? Uma camada ou casta privilegiada. Não a definimos como uma classe, mas como uma casta, uma excrescência da sociedade. Podemos fazer uma analogia com a burocracia dos sindicatos operários, com os limites da comparação entre um sindicato e um Estado. A partir de seu posto, o burocrata sindical não trabalha, seus privilégios dependem do cargo, por isso seu lugar na sociedade é muito mais instável que o de um burguês. O burguês depende da propriedade, estabelecida juridicamente e defendida pelo Estado. O burocrata não é dono do sindicato, ou da fábrica que administra num Estado operário, é uma casta que domina coercitivamente, mas não uma classe.
Do que depende em última instância a burocratização do Estado operário? Do desenvolvimento internacional da revolução. É inevitável que haja pressões à burocratização, mas não é inevitável que esta se imponha. Depende do desenvolvimento histórico da luta de classes: se a União Soviética não tivesse ficado isolada pela derrota da revolução alemã e estivessem unidas em um plano comum ambas as economias, não teria havido esta escassez e as tendências à burocratização teriam sido muito menores.
Trotsky faz o seguinte prognóstico: o Estado operário degenerou burocraticamente, já não há uma democracia proletária, mas uma ditadura burocrática, o proletariado domina socialmente porque as fábricas nacionalizadas não voltaram a ser propriedade burguesa; mas o proletariado foi expropriado do poder político. Há uma contradição entre as bases econômicas conquistadas pela revolução e o aparato político burocrático que domina o Estado. Essa contradição terá que resolver-se. Ou a burocracia esmaga a propriedade nacionalizada e liquida as conquistas da revolução ou o proletariado varre a burocracia e restaura a democracia soviética. Então, o programa dos trotskistas era de uma revolução política, que varresse a dominação política da burocracia, mas mantivesse a economia nacionalizada. A burocracia defenderá seus privilégios até a morte, o proletariado deve construir então seu próprio partido para derrubá-la pela via revolucionária.
Depois da Segunda Guerra Mundial a burguesia é expropriada em vários países. Com revoluções em países semicoloniais e por transformações “a partir de cima” no Leste da Europa pela invasão do Exército Vermelho. Na China, na Iugoslávia, no Leste da Europa, Cuba, Vietnam e outros países, há novos Estados operários onde se expropria a burguesia. A economia se parece à da URSS e o regime político também. Mas surgem burocratizados desde o começo. Que era a URSS? Um Estado operário “degenerado”. Havia surgido revolucionário, e somente depois se burocratiza. Os outros Estados, por que são estados operários deformados, como definiu a IV Internacional? Na Tchecoslováquia, Polônia, Hungria, Bulgária, não são as massas que subvertem os regimes, mas o Exército Vermelho dizendo: agora os governa os Partidos Comunistas (stalinistas) de cada país, alinhado com a burocracia do Kremlin. Nos países onde a burguesia foi expropriada “desde cima”, colocam-se funcionários adeptos a Moscou. Desde o princípio há um regime despótico, de partido único. Nos países onde houve revolução, não obstante, a estrutura militar dos partidos-exércitos camponeses se transfere ao aparato de estado, e nunca os operários e camponeses podem desenvolver uma democracia soviética. Estes Estados, sejam os que surgiram de revoluções, como também os expropriados “desde cima”, são Estados operários “deformados”.

Restauração capitalista


Trotsky via algumas variantes possíveis de restauração capitalista: que o stalinismo fosse derrotado na guerra por Hitler (ou alguma outra potência); uma variante intermediária, que por debilidade da burocracia, setores internos das massas busquem enriquecer-se e digam: “voltemos ao capitalismo”; ou que a própria burocracia empreenda o caminho de tornar-se proprietária capitalista, que foi o que finalmente aconteceu. A URSS não caiu por invasão dos EUA, mas porque uma parte da burocracia quis assegurar seus privilégios, transformando-se ela mesma em burguesia, ante o temor do descontentamento das massas que expressou a revolução polonesa de 1980-81. As novas burguesias da Rússia e do Leste europeu, provêm das fileiras stalinistas. Na China, o Partido Comunista encabeçou a restauração. Quem já viajou a Cuba pôde ver que a burocracia tem múltiplos privilégios, que os trabalhadores e camponeses não vivem como os funcionários nem como os novos ricos cubanos que surgiram com as reformas pró-capitalistas.
Em Cuba, estamos contra a burocracia, mas defendemos a independência nacional com respeito ao imperialismo, e a economia nacionalizada. Nossa consigna é: abaixo o regime da burocracia, legalidade a todos os partidos que defendem a revolução, não aos gusanos de Miami. Não queremos varrer o regime burocrático para ter uma democracia capitalista dominada pelos monopólios, mas terminar com a burocracia e seus privilégios, para que Cuba seja uma trincheira no desenvolvimento da revolução socialista latino-americana e mundial. Queremos salvar Cuba da restauração capitalista, porque há setores da burocracia que estão fazendo sua própria “acumulação primitiva”, e contam os dias para ver quando se transformam em burgueses.
Trotsky nos deixa o programa da revolução política, que mantém vigência nos países onde o capital foi expropriado, e também para o projeto de socialismo pelo qual lutamos. Nós lutamos pela democracia proletária, para isso há que fazer a revolução proletária e nacionalizar os meios de produção, como um passo a sua socialização crescente. Isso nos distingue das correntes stalinistas que sustentam um “socialismo de quartel”. Estamos por um Estado operário baseado na democracia soviética. Defendemos a liberdade de tendências em todas as organizações dos trabalhadores, nos sindicatos ou nos organismos de frente única. Somos trotskistas, partidistas e sovietistas ao mesmo tempo. No movimento operário, estamos pela democracia proletária porque a experiência política das massas nessa democracia favorece os revolucionários. Ante a falsa opção de uma democracia liberal ou um totalitarismo burocrático, estamos pela democracia dos trabalhadores, que é a ditadura do proletariado, como passo prévio, indispensável, para criar as condições de uma nova sociedade socialista baseada na fraternidade humana.


domingo, 7 de outubro de 2012

INDONÉSIA: GREVE GERAL POR SALÁRIOS E CONTRA A PRECARIZAÇÃO


COMO MAIS UM EXEMPLO DOS NOVOS "TEMPOS" QUE ESTAMOS VIVENDO, SOBRETUDO COM A CRISE ECONÔMICA INTERNACIONAL E SEUS DESDOBRAMENTOS POLÍTICOS, SOCIAIS E IDEOLÓGICOS, O BLOG "ADEUS AO CAPITAL", COMPROMETIDO COM A LUTA INTERNACIONAL DOS TRABALHADORES, PUBLICA UM ARTIGO DE DIEGO DALAI, DO ÚLTIMO NÚMERO DO JORNAL "A VERDADE OPERÁRIA" (PERIÓDICO DO PTS, ORGANIZAÇÃO IRMÃ DA LER-QI NA ARGENTINA) A RESPEITO DA RECENTE GREVE GERAL NA INDONÉSIA.
ACHAMOS FUNDAMENTAL QUE OS REVOLUCIONÁRIOS, E TODOS AQUELES QUE COMPARTILHAM DA LUTA SEM FRONTEIRAS DA CLASSE OPERÁRIA E DOS OPRIMIDOS, ACOMPANHEM DETIDAMENTE A SITUAÇÃO INTERNACIONAL E PRINCIPALMENTE OS PRIMEIROS PASSOS DA CLASSE TRABALHADORA NO RESGATE DE SUA ORGANIZAÇÃO E MÉTODOS DE LUTA, ASSIM COMO TAMBÉM NA SUA SUBJETIVIDADE ANTICAPITALISTA. ESSE É UM TERRENO FÉRTIL PARA TODOS AQUELES QUE COMPARTILHAM DA ESTRATÉGIA MARXISTA REVOLUCIONÁRIA DEIXADA POR GRANDES REVOLUCIONÁRIOS COMO MARX, ENGELS, LENIN, ROSA E TROTSKY.

Greve Geral por salários e contra a precarização do Trabalho.

Por: Diego Dalai

Indonésia: Um gigante industrial sai a lutar.





Cerca de três milhões de operários industrias protagonizaram uma massiva greve geral na última Quarta-Feira ( 3 de outubro) nesse país do sudeste asiático. Nos parques industriais mais importantes do país as atividades ficaram totalmente paralisadas. Entre as empresas mais afetadas se encontra a petroleira estatal “Pertamina”.
Dezenas de milhares de operários se mobilizaram por todo o país, especialmente nos distritos industriais, mas também na capital, Jacarta, assim como em outras várias importantes cidades do arquipélago. Com essa modalidade “descentralizada” de protestos foram afetados 80 parques industriais e 24 cidades. A polícia montou um imenso operativo em torno das marchas com milhares de efetivos. Somente em Jacarta colocou 15.000 policiais para defender os edifícios do governo e outros pontos estratégicos.

Por salários e contra a precarização.



O protesto foi convocado pelas centrais sindicais KSPI e KSBSI e encabeçado, entre outros sindicatos, pelo “Indonesian Metal Workers Federation” (Federação dos operários metalúrgicos indonésios – FSPMI). Os operários exigem um aumento substancial dos salários e o fim da lei de contratos temporários, sistema conhecido como “outsourcing”, que nem ao menos garante um serviço de saúde aos trabalhadores. Dessa maneira, essa luta se torna muito importante já que ataca um aspecto essencial da exploração capitalista e ajuda a unificar o conjunto dos trabalhadores. Principalmente se levarmos em conta que muitas empresas até então radicadas na China estão começando a investir mais em países como Vietnã e Indonésia, onde o preço da mão de obra é ainda mais barato. Há alguns meses a referida lei de contrato temporário foi declarada inconstitucional pelo próprio Tribunal Constitucional da Indonésia, mesmo assim o sistema continua em pleno vigor.
Os empresários, através da Câmara de Comércio, rapidamente saíram a exigir do governo que mantenha o contrato temporário, que dura um ano até que os empregados possam ser efetivados. A Indonésia é uma das grandes “oficinas do mundo” com milhões de operários industriais e de serviços e uma grande concentração de multinacionais imperialistas que aproveitam do baixo custo salarial e da extensa precarização laboral. Esse alto nível de “industrialização” não pode esconder as milhões de pessoas que vivem na miséria e no desemprego. Segundo dados oficiais existem 32 milhões de pessoas abaixo da linha da pobreza (13% da população). Em que pese o relativo baixo índice de desemprego (6%), o salário mínimo é de 1,5 milhões de rupias (moeda local), enquanto estudos indicam que para viver dignamente seja necessário cerca de 3,7 milhões. Por isso mesmo, o aumento dos salários e o fim da precarização são os motores da atual mobilização.
Em meio a uma crise econômica que atravessa o mundo, esta greve, junto a outros inúmeros conflitos trabalhistas que registra a China e outros países da região como a Coréia do Sul ou a Índia, é uma demonstração confiável da força que a classe operária pode alcançar. 

4 de Outubro de 2012

Tradução: Rafael dos Santos

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

20 ANOS DO MASSACRE DO CARANDIRU

REPRODUZIMOS ARTIGO DA COMPANHEIRA LETÍCIA, MILITANTE DA LER-QI, SOBRE O MASSACRE POLICIAL NA PENITENCIÁRIA DO CARANDIRU QUE NO ÚLTIMO DIA 2 DE OUTUBRO COMPLETOU 20 ANOS.


Por Leticia Parks, estudante de Letras da USP

Esse artigo é uma homenagem aos 111 mortos pela policia aos 2 de outubro de 1992, na casa de detenção de São Paulo, o Carandiru; A todos os negros e pobres que já foram vitimas do Estado capitalista em todo o mundo e de sua policia assassina.


Ratatatá, caviar e champanhe. Fleury foi almoçar, que se foda a minha mãe! Cachorros assassinos, gás lacrimogêneo... quem mata mais ladrão ganha medalha de prêmio! O ser humano é descartável no Brasil. Como modess usado ou bombril. Cadeia? Claro que o sistema não quis. Esconde o que a novela não diz. Ratatatá! sangue jorra como água. Do ouvido, da boca e nariz. (…) Cadáveres no poço, no pátio interno. Adolf Hitler sorri no inferno! O Robocop do governo é frio, não sente pena. Só ódio e ri como a hiena. Ratatatá, Fleury e sua gangue vão nadar numa piscina de sangue. Mas quem vai acreditar no meu depoimento? Dia 3 de outubro, diário de um detento." Diario de um detento, Racionais MC’s, musica gravada em 1997


  Há exatos 20 anos, no dia 2 de outubro de 1992, cento e onze detentos eram assassinados pela policia militar do Estado de São Paulo após uma rebelião que havia se iniciado no Pavilhão 9 da casa de detenção. Vendida para a imprensa como uma guerra entre a polícia e os ditos “criminosos”, dos mais de 300 policiais envolvidos na repressão a rebelião, nenhum foi morto, e há alegações de presidiários e familiares de que os dados divulgados pela policia escondem uma serie de mortos.
Na Folha de São Paulo de 28 de setembro de 1997, o perito responsável por averiguar abusos policiais declarou: Comprovamos a existência de rajadas de metralhadora a cerca de 50 centímetros do solo, o que indica que os presos foram mortos ajoelhados. Todas as marcas de bala eram de disparos numa só direção. Não havia marcas de disparos no sentido contrário, o que demonstra que não houve tiros contra os policiais.
Dentre os policias envolvidos no caso, 14 já respondiam acusações anteriores por outros 148 casos de homicídio ou tentativa de homicídio. Uma serie de oficiais responsáveis pelo massacre foram posteriormente promovidos à alta e media patente, como é o caso do então tenente-coronel Armando Rafael Araújo, elevado a Comandante do Regimento de Cavalaria Nove de Julho, acusado de ferir 87 detentos, existindo ainda um grupo de cinco policiais que, apesar de envolvidos no massacre, sequer são acusados e seguem atuando na policia militar como policias não uniformizados (policia investigadora).
Comandado pelo governador do Estado da época, Luiz Antônio Fleury Filho, tal massacre segue impune, e os familiares de mortos, que esperaram mais de 6 dias para saberem noticias de seus filhos, pais e esposos; assim como os feridos, que passaram mais de 2 dias aguardando atendimento medico, estão ainda distantes de obter qualquer pronunciamento do Estado, qualquer sinal de justiça sobre tamanha carga carregada em suas vidas.

O racismo e as penitenciarias brasileiras



Não são poucas as ocasiões em que membros da grande política nacional declaram que o Brasil avança a quase nulidade da existência do racismo. Tal discurso é comum para dizer que vivemos no país da miscigenação, e que qualquer questionamento ao racismo se anula pela inexistência de pessoas negras.

A realidade nos demonstra contraditoriamente que para além de vivermos no pais com a maior composição negra depois do continente africano, o Estado brasileiro através de seus braços armados estatais é responsável por índices recordes de assassinato de negros comparáveis apenas aos massacres do Apartheid, ao racismo ao sul dos Estados Unidos, as históricas guerras civis financiadas pelos imperialismos europeus que assassinaram massas inteiras de população negra em países como Ruanda e Burundi, e as que ainda seguem sendo financiadas.
No Relatório do Desenvolvimento Humano de 2005, os dados mostram que no Estado do Rio de Janeiro, onde os negros (pretos e pardos) chegam a 45% da população, são 54% dos assassinados pela policia, enquanto os brancos (54,5% da população) são 19,7% dos mortos pela policia. Em São Paulo, os brancos são 70% da população e 30% dos assassinados pela policia, mais uma relação invertida que demonstra que as balas policiais recorrem a alvos negros.
A condição de pária social a qual o negro foi lançado com o fim da escravidão, tendo seu trabalho substituído pelo assalariado europeu, o que fez com que fosse a população mais sujeita a pobreza e a métodos precários ou violentos de sobrevivência. Durante a ditadura militar, os negros foram atraídos aos centros urbanos pela alta industrialização do período, que teve como base a ampliação do trabalho precário na construção civil, nas cozinhas e na limpeza das fabricas que passavam a ser construídas nos estados de São Paulo, Rio de janeiro e Minas Gerais. Aglomerando-se nas favelas e periferias desses centros, os negros passaram a concentram também um forte espírito de rebeldia, atacado pelas péssimas condições de trabalho e sobrevivência a qual eram submetidos, sendo novamente, assim como em todos os outros regimes já existentes no Brasil – desde a colônia, passando pelo império e chegando a republica – o negro passou novamente a ser foco da repressão do Estado pela via da policia, dos grupos de extermínio e do sistema prisional.
Nesse período, a Casa de detenção de São Paulo (o Carandiru) passa a ter superlotação, favorável a vista grossa sobre assassinatos policiais e abusos sobre a vida. A população carcerária brasileira é hoje a quarta maior do mundo, perdendo apenas para EUA, China e Rússia, com cerca de 75% dos presidiários negros, pobres e com baixa escolaridade.
Sob o pretexto de um crime cumprido, essa população é retirada do convívio social enquanto quem realmente ganha com o crime organizado são os altos políticos, estes que lucram 50 bilhões dos cofres públicos através de suas ações fraudulentas 2, o que garantiria cerca de R$8,3 mil por mês para a saúde, educação e alimentação de cada um dos mais de 500 mil presidiários sem direito a liberdade, por serem varejistas do trafico de drogas sujeitos as menores taxas de expectativa de vida; ladrões famélicos; sociopatas de uma sociedade enlouquecedora onde pais e mães agridem seus filhos, mulheres são assassinadas e estupradas por seus maridos, pais, avos, desconhecidos; onde a grande maioria da população é destinada ao trabalho e vida precários.
Tal sistema social onde muitos tem pouco e poucos tem muito, onde a riqueza é controlada de maneira invisível aos trabalhadores que a produzem, continuamos sem saber quanto de nos é roubado em cada mercadoria que produzimos, quanto de nos negros foi roubado das plantações de cana, de algodão, de café, da construção civil, e quanto esse Estado fraudulento fatura com as mortes negras do trafico de drogas, da prostituição. Com certeza muito mais do que R$8,3 mil para cada homem e mulher vivos em todo o mundo.

O Estado e o massacre


20 anos após o massacre e nenhum dos policiais envolvidos foi punido. Pelo contrario, uma serie deles obtiveram promoções e candidaturas políticas legalizadas pelo Estado.

Ubiratan Guimarães, policial comandante da operação, após ter sido considerado culpado em 2001, recorreu e foi inocentado pelos desembargadores do Tribunal de Justiça, contando com foro especial de parlamentar por ter se eleito deputado estadual pelo PTB. Após ter comandado o massacre que ocasionou 111 mortes, sua sigla de campanha pelo Partido Trabalhista Brasileiro era 14-111.
Essa não é a única demonstração de um Estado que sente orgulho dessas mortes. O comandante das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (ROTA), Nivaldo Cesar Restivo, esta entre os 119 PMs denunciados pelo massacre, e seu predecessor, o tenente-coronel Salvador Madia, também responde ação penal pelo massacre, sendo acusado direto de 73 das 111 mortes. Não à toa comandam a herdeira direta dos grupos de extermínio a população negra da ditadura militar, e aplicam sobre os negros e jovens pobres de periferia as mesmas medidas utilizadas na ditadura e no massacre – torturas, esquartejamentos, ocultamento de cadáveres, execuções sumarias – respondendo as necessidades do Estado capitalista brasileiro de conter uma população que de tão superexplorada e oprimida, se não for também reprimida, se colocaria de pé, em luta contra sua condição histórica desde que roubada da África, a exemplo do que foi a revolução haitiana, primeiro estado com o poder tomado pelos escravos; ou mesmo da marcante organização dos negros em torno do Partido dos Panteras Negras, que reivindicava o marxismo e o uso das armas em autodefesa para responder as mortes geradas pela forca policial nos EUA.
Tal massacre, assim como os seus predecessores e os que seguem acontecendo ate hoje, haja vista as mais de 229 assassinatos pela PM de jovens negros apenas no primeiro semestre desse ano (dois Carandirus sem nenhuma rebelião), não devem ser vistos como meros abusos policiais ou consequências de uma situação de “guerra civil”. A isso, chamamos genocídio, e a ação policial, chamamos ordens de um Estado capitalista, que mantém seus lucros sobre a proteção da propriedade privada pela policia, sobre a morte de jovens pobres, negros, sobre a prisão dos corpos das mulheres, sobre a fome e a superexploração.
Esse Estado é o que segue dirigido por diferentes partidos que defendem apenas os interesses da burguesia e dos patrões, e que a cada ano reúnem em suas propagandas eleitorais escoriosos representantes diretos dessa política genocida do Estado brasileiro e de muitos outros pelo mundo. A exemplo disso, em apoio a Serra, quem o nomeou para comandante da ROTA, o coronel Telhada (PSDB) se candidata para vereador com a campanha de “uma nova ROTA para São Paulo”, que tem como conteúdo a ofensiva contra a “violência”, que obviamente não é a condenação da sua, pois segue impune pelas 36 mortes pelas quais é responsável, e sim a manutenção e fortificação de seus métodos.
O PSD de Kassab sai com a candidatura de coronel Camillo, comandante da desocupação do Pinheirinho, com mais de 1600 famílias desabrigadas, onde houve registro do estupro de uma jovem por policiais militares, que durou mais de 4 horas.
A policia militar, seus grupos de extermínio e suas figuras publicas passam a ser cada dia mais propagandeados. Para um período de crise, a burguesia faz sua propaganda repressiva, e nos da LER-QI nos juntamos aos gritos dos que se indignam contra cada pratica genocida, contra cada ataque a população pobre e a classe trabalhadora, dizendo que por aqui não passarão, e que se alguém pagara pela violência existente nesse sistema não serão as vitimas dela, mas os responsáveis pela sua existência.

Justiça! Pela punição imediata de todos os responsáveis e envolvidos no massacre de 2 de outubro de 1992!

Liberdade a todo o povo negro! Pelo fim do sistema prisional, atendimento de saúde e educação de qualidade desde a infância para toda a população!

Nenhuma morte em silencio! Pela abertura de todos os arquivos denominados “resistência seguida de morte”, assim como de todos os arquivos da ditadura, com punição imediata aos torturadores de ontem e hoje!


terça-feira, 2 de outubro de 2012

CICLO DE ESTUDOS POR QUÊ TROTSKY?





1940-2012: A 72 ANOS DO ASSASSINATO DE LEON TROTSKY

Minha vida*: traços biográficos de uma vida revolucionária

Por Hernán Aragón, PTS

As classes dominantes tentam fazer com que nós, os explorados, não tenhamos história. Sua intenção é que os séculos de luta da classe operária contra o capitalismo, o desenvolvimento do marxismo revolucionário e os grandes homens e mulheres que encarnaram aquelas lutas, fiquem no esquecimento. Querem que sempre comecemos de novo. Uma juventude revolucionária deve apropriar-se do melhor de nosso passado. Abraçar e compreender nossa tradição e nossa história, não como letra morta mas como um universo de experiências, de lições políticas e de vida. Leon Trotski é um exemplo central da tradição que deve ser recuperada, defendida e aprofundada por uma juventude revolucionária que se proponha a avançar na luta contra os exploradores, em plena crise mundial. Neste novo aniversário do seu assassinato, a juventude do PTS se propõe a organizar diferentes atividades de homenagem. Procuraremos contribuir para que as novas gerações tomem seu legado. Trotski dizia: há que “inspirar à juventude confiança em suas próprias forças e em seu futuro. Apenas o entusiasmo fresco e o espírito beligerante da juventude podem assegurar os primeiros triunfos da luta e apenas estes devolverão ao caminho revolucionário os melhores elementos da velha geração”.

Coberto por esteiras, palha e feno, ele conseguiu chegar até uma estação ferroviária. Ali o esperava uma bolsa que uns amigos lhe haviam preparado para completar a fuga. Nela não havia nada de luxuoso: alguma roupa, uma gravata e um volume de Homero. O jovem levava no bolso um passaporte falso que ele mesmo tinha fabricado com um nome escolhido ao acaso estampado nele.

35 anos mais tarde, em seu último exílio em Coyoacan, Lev Davidovich Bronstein registrava em atas que aquele nome, escrito ao acaso em 1902, seria aquele que genuinamente o acompanharia pelo resto da sua vida.

Hoje o nome de Trotski continua sendo o estigma maldito da revolução proletária, uma ameaça da qual a burguesia não pôde se desfazer.

O “melhor bolchevique” – como o definira Lenin – descobria três anos após o Outubro vermelho, que o dia do seu nascimento coincidia com a data da revolução. Riu-se deste dado do acaso, deixando sua análise para os místicos. Não se podia esperar outra coisa de quem já registrara em seu testamento, no mesmo ano do seu assassinato, que morreria sendo um revolucionário proletário, um marxista, um materialista dialético e, em consequência, um ateu irreconciliável.

Já desde bem cedo, o rapaz de Odessa compreendeu que os acontecimentos de sua vida pessoal estariam inseridos na trama dos fatos históricos e que seria quase impossível arrancá-los dela. Quão chocante soa este pensamento para o individualismo que a burguesia professa e ao mesmo tempo quão profundamente o almejamos.

“Eu olhava firmemente – escreveu ele sobre seus primeiros anos na escola secundária – com total confiança e curiosidade a todos aqueles colegas e pessoas com quem me encontrava. Mas de repente, um rapaz alto e magro, de uns treze anos – que deveria estar provavelmente vindo de uma fábrica, já que levava nas mãos um pedaço de chapa metálica – se deteve diante do meu uniforme resplandecente, balançou a cabeça, tossiu ruidosamente e lançou uma boa cusparada sobre minha blusa nova; olhou para mim com desprezo e sem dizer uma palavra, seguiu seu caminho.

O que o impulsionava a agir assim? Hoje está claro para mim: um garoto carente de tudo, com camisa maltrapilha, os pés mal cobertos por faixas, obrigado a fazer os sujos encargos dos seus patrões enquanto que os filhos dos senhores resplandeciam com seus belos uniformes escolares ... O garoto tinha descarregado ali, sobre mim, seu sentimento de protesto social”.

Este “protesto social” seria a tinta inapagável que guiaria o compromisso de uma vida dedicada a acabar com as injustiças que a sociedade de classes engendra. Trotski se sentia especialmente incomodado pelos pseudo-revolucionários, as pessoas dedicadas a cultivar seu prestígio pessoal, os diletantes, os espíritos cansados. Apenas exigia de parte do revolucionário a entrega do seu tempo, suas forças e meios, como ele tinha feito já aos 17 anos ao se misturar aos bairros operários de Nicolaiev. Nesses primeiros anos de militância na “Liga operária do Sul da Rússia” forjou seu oficio de revolucionário e escritor, passando semanas inteiras com as costas curvadas desenhando com o maior dos cuidados as letras em que se imprimiram panfletos e artigos para os operários. O movimento foi crescendo e Trotski foi preso e deportado para a Sibéria aos 19 anos, onde conheceu Alexandra Lvovna com quem o trabalho comum pela causa o uniu intimamente.

Na prisão abraçou definitivamente a teoria marxista, à qual se dedicaria com total aplicação e cuidadoso estudo. “Minha atividade consciente e ativa foi uma constante luta por ideias determinadas” dirá. O exilado regressou à Rússia em 1905 e foi eleito presidente do soviete de Petrogrado. Em outubro desse ano, as massas que o soviete tinham levantado concentram-se furiosas diante da Universidade de São Petersburgo. O jovem, que está ao ponto de completar 25 anos, sobe no alto de um balcão para dirigir-lhes a palavra. Mirando firmemente à multidão, toma o manifesto do tzar e o rasga, lançando os pedaços ao vento. Trotski reafirmava que não pode haver reconciliação com os inimigos do povo.

Quando a revolução parecia definitivamente liquidada, escreveu que “entre as nuvens negras da reação que nos cercam, já se atiça o resplendor triunfante de um novo Outubro”.

Sua previsão não falhou. Mas aquelas palavras indicavam sobretudo que sua confiança na classe operária e no futuro socialista da humanidade se tornaria mais potente no futuro, inclusive sob a longa noite do stalinismo.

Neste período Trotski foi a expressão de um movimento de resistência operária e popular que mesmo nos campos de concentração continuou batalhando contra a burocracia soviética. Esta é nossa tradição e nosso orgulho. Sem a luta que o fundador da IV Internacional levou adiante, hoje apenas restaria como socialismo os crimes de Stálin.

Trotski escreveu uma vez que todo verdadeiro orador tem momentos de inspiração nos quais de sua boca brota algo mais poderoso que as palavras que saem em momentos normais. Como criador do Exército Vermelho, que também foi o orador da revolução, essas forças poderosas continuariam vibrando até seu último suspiro. E o fizeram com a mesma paixão e alegria com a qual o jovem de Nicolaiev recebia os informes das fábricas contando como “as letras cor violeta tinham sido avidamente lidas, transmitidas e ardentemente discutidas pelos operários”.

Na época tumultuada que nos tocará viver nós, os trabalhadores e a juventude, estamos convocados a tomar essa bandeira limpa que o grande revolucionário nos legou para nela encontrar a inspiração que nos ajude a preparar o futuro.

Ao longo de 45 capítulos, neste livro, Trotski relata sua infância, seu juvenil início na vida revolucionária, prisões, fugas e exílios, sua participação na Revolução de 1905, suas conclusões e inovações teóricas, suas relações com a II Internacional, sua ruptura com ela na I Guerra Mundial, seu ingresso no partido de Lenin antes de co-dirigir com ele a conquista do poder em Outubro de 1917, seu papel central na guerra civil, em Brest-Litovsk e, especialmente na oposição, desde seu início, ao processo de burocratização da URSS.

Sendo uma de suas obras mais conhecidas, esta edição em castelhano, além de incorporar outros artigos autobiográficos é uma nova versão, revisada e corrigida, segundo a edição francesa abreviada publicada por A.Rosmer em 1953, que agregou um Apêndice de sua autoria, que percorre os últimos anos de exílio de Trotski na Turquia, França, Noruega para finalizar no México, onde será assassinado por um facínora a mando de Stálin. Sua vida concentra acontecimentos revolucionários e contrarrevolucionários de tal magnitude – que cada um deles pode ser estudado e aprofundado em separado. Sua práxis revolucionária é o que mais se destaca ao longo de sua vida consciente, para além das grandes tragédias pessoais que desabaram sobre ele. Apresentamos, por isso, uma das maiores autobiografias do século XX.

* Esta resenha, escrita por um combatente da juventude revolucionária argentina, examina o livro Minha vida, de Leon Trotski, publicado este mês pelo C.E.I.P.-León Trotsky, Buenos Aires.

Traduzido por Gilson Dantas