segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

A LEI DE DROGAS E O ENCARCERAMENTO DA JUVENTUDE NEGRA

 Rafael Borges

A atual “lei de drogas”, lei 11.343 de 23 de Agosto de 2006, foi promulgada com o objetivo de endurecer as sanções contra o tráfico e tratar o uso de drogas como problema de saúde pública. A legislação pretendia assim reduzir o número de prisões de pequenos portadores de drogas ilícitas e focar no alto comando do tráfico.
No entanto, como aponta a pesquisa realizada pelo sociólogo da USP Marcelo da Silveira Campos e publicada no jornal O Estado de S. Paulo, a população penitenciária brasileira aumentou 77,5% entre 2005 e 2013, período que abarca os sete primeiros anos de aplicação da lei. Não há dúvidas que esse crescimento vertiginoso da população carcerária do país está diretamente ligado a publicação da nova lei de drogas. 
O pesquisador, professor-adjunto da Faculdade de Ciências Humanas Universidade Federal de Grande Dourados (MS), sustenta que “muitas vezes, usuários que deveriam ser enviados, segundo a lei, para unidades de saúde ou assistência social estão sendo deslocados para as prisões”. Acrescentamos também o grande número de prisões de jovens da baixa hierarquia do tráfico que vendem pequenas porções de drogas para completar a renda de casa.



A lei de drogas não apresenta qualquer parâmetro ou quantidade específica para o que deva ser considerado tráfico ou para uso próprio. Cabe ao juiz tal análise. Que as exceções na magistratura me perdoem, mas o velho racismo impregnado nas instituições do regime e em suas altas autoridades mostra que a cor da pele e a região de origem são os critérios mais utilizados na hora de qualificar se uma pessoa é traficante ou usuário. A pesquisa do sociólogo da USP apontou que entre os anos de 2004 e 2009 uma pessoa flagrada portando drogas no Bairro de Itaquera, periferia da Capital paulista, tinha quatro vezes mais probabilidade de ser incriminada por tráfico do que notificada por uso. 
Esse estrondoso crescimento da população carcerária fez com que o Brasil atingisse, em 2014, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2015, o número de 607.373 presos no território nacional, sendo que quase 70% são pessoas negras. Quase 10 anos depois de sua publicação, a mesma lei que dá suporte legal para o encarceramento de usuários ou de jovens da baixa hierarquia do tráfico deixou intacta a estrutura de comando do tráfico e seus “representantes” políticos. 
O judiciário, tão lento e ineficaz para julgar os crimes do colarinho branco, é sempre tão rápido para encaminhar jovens para presídios e a fundação casa. Uma justiça de classe tão dura contra jovens que portam alguns poucos gramas de maconha e tão complacente com empresários e políticos cujas fazendas recebem meia tonelada de cocaína.



Os presídios lotam em um ritmo alucinante, mas alguém se arrisca a dizer que os problemas de violência e criminalidade estão diminuindo? É a comprovação da falência da atual política de drogas. O que queremos destacar aqui é que embora a lei de Drogas apresente um ou outro aspecto que, num primeiro momento pode parecer progressivo, não conseguiu frear o tráfico de drogas e reduzir o encarceramento de usuários. Não atingiu seus objetivos, pois a lei de drogas é apenas um fio de uma longa teia formada por instituições marcadas pelo ódio contra os negros e por uma realidade onde predomina a super- exploração, a profunda desigualdade social, a falta de cultura e lazer nas periferias.

Qualquer tentativa séria de acabar com o tráfico e a cadeia de crimes e violência que o cerca precisa ser feita, no mínimo, na perspectiva de descriminalização das drogas, fim da polícia militar, investimento na saúde e garantia de acesso ao conjunto de equipamentos e serviços para os usuários.  

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