Rafael Borges
A atual “lei de drogas”,
lei 11.343 de 23 de Agosto de 2006, foi promulgada com o objetivo de endurecer
as sanções contra o tráfico e tratar o uso de drogas como problema de saúde
pública. A legislação pretendia assim reduzir o número de prisões de pequenos
portadores de drogas ilícitas e focar no alto comando do tráfico.
No entanto, como aponta
a pesquisa realizada pelo sociólogo da USP Marcelo da Silveira Campos e
publicada no jornal O Estado de S. Paulo, a população penitenciária brasileira
aumentou 77,5% entre 2005 e 2013, período que abarca os sete primeiros anos de
aplicação da lei. Não há dúvidas que esse crescimento vertiginoso da população
carcerária do país está diretamente ligado a publicação da nova lei de drogas.
O pesquisador, professor-adjunto da Faculdade de Ciências Humanas Universidade
Federal de Grande Dourados (MS), sustenta que “muitas vezes, usuários que
deveriam ser enviados, segundo a lei, para unidades de saúde ou assistência
social estão sendo deslocados para as prisões”. Acrescentamos também o grande número
de prisões de jovens da baixa hierarquia do tráfico que vendem pequenas porções
de drogas para completar a renda de casa.
A lei de drogas não
apresenta qualquer parâmetro ou quantidade específica para o que deva ser
considerado tráfico ou para uso próprio. Cabe ao juiz tal análise. Que as
exceções na magistratura me perdoem, mas o velho racismo impregnado nas
instituições do regime e em suas altas autoridades mostra que a cor da pele e a
região de origem são os critérios mais utilizados na hora de qualificar se uma
pessoa é traficante ou usuário. A pesquisa do sociólogo da USP apontou que
entre os anos de 2004 e 2009 uma pessoa flagrada portando drogas no Bairro de
Itaquera, periferia da Capital paulista, tinha quatro vezes mais probabilidade
de ser incriminada por tráfico do que notificada por uso.
Esse estrondoso
crescimento da população carcerária fez com que o Brasil atingisse, em 2014,
segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2015, o número de 607.373
presos no território nacional, sendo que quase 70% são pessoas negras. Quase 10
anos depois de sua publicação, a mesma lei que dá suporte legal para o
encarceramento de usuários ou de jovens da baixa hierarquia do tráfico deixou
intacta a estrutura de comando do tráfico e seus “representantes” políticos.
O
judiciário, tão lento e ineficaz para julgar os crimes do colarinho branco, é
sempre tão rápido para encaminhar jovens para presídios e a fundação casa. Uma
justiça de classe tão dura contra jovens que portam alguns poucos gramas de maconha e
tão complacente com empresários e políticos cujas fazendas recebem meia
tonelada de cocaína.
Os presídios lotam em
um ritmo alucinante, mas alguém se arrisca a dizer que os problemas de
violência e criminalidade estão diminuindo? É a comprovação da falência da atual
política de drogas. O que queremos destacar aqui é que embora a lei de Drogas
apresente um ou outro aspecto que, num primeiro momento pode parecer
progressivo, não conseguiu frear o tráfico de drogas e reduzir o encarceramento
de usuários. Não atingiu seus objetivos, pois a lei de drogas é apenas um fio
de uma longa teia formada por instituições marcadas pelo ódio contra os negros
e por uma realidade onde predomina a super- exploração, a profunda desigualdade
social, a falta de cultura e lazer nas periferias.
Qualquer tentativa
séria de acabar com o tráfico e a cadeia de crimes e violência que o cerca
precisa ser feita, no mínimo, na perspectiva de descriminalização das drogas,
fim da polícia militar, investimento na saúde e garantia de acesso ao conjunto
de equipamentos e serviços para os usuários.
Nenhum comentário:
Postar um comentário