Um
comentário a propósito do escritor chinês Mo Yan
Demian Paredes ( Traduzido diretamente do Blog do Instituto de Pensamento Socialista -IPS- "karl Marx")
A recente entrega do Prêmio Nobel de
Literatura para Mo Yan gerou uma série de analises e debates. Para Além das “afinidades
selecionadas” pelo escritor chinês, que tem por referência Gabriel García
Marquez e William Faulkner... e as comparações entre ele e Franz Kafka, o que
fica claro é que Mo Yan representa um caso único de paradoxos, desses que podem
(e geralmente) surgem na história da luta de classes, das revoluções e contrarrevoluções...
e alguns fenômenos aberrantes: O autor de “Sorgo Vermelho” não somente foi
integrante do chamado exército popular de Libertação – sustentáculo fundamental
do regime do Estado Operário Deformado que surge com a revolução de 1948-49 e
que, desde 1978, com Deng Xiao Ping, se “abriu” decididamente para a
restauração capitalista-, mas também, como escritor, relatava a dura vida dos
camponeses, trabalhadores, jovens e velhos sob o regime burocrático... que ele
mesmo sustentava como integrante das forças armadas!
Como se não bastasse, o principal
fato que demonstra que Mo Yan é um artista “oficialista” – para além da sua permanência
como professor de Literatura na Academia das Forças Armadas – ocorreu esse ano
quando integrou o rol de 100 escritores que comemoraram a intervenção de Mao
Tse-Tung sobre a arte durante o “ Forúm de Yenan” em seu 70º aniversário...
copiando a mão os discursos do “grande líder” sobre “como a arte deve servir ao
comunismo”.
O que disse Mao, precisamente ali, em
1942? Várias coisas: que os artistas não deveriam experimentar e nem
desenvolver sua livre criação sob pena de ficarem “isolados do povo”,
por que seguramente as massas não entenderiam “as expressões bizarras
inventadas pelos artistas e completamente alheias ao uso popular”, que os
artistas deveriam, ao contrário de qualquer experimentação e/ou introspecção,
gerar obras “explicitamente políticas”, que auxiliem na luta contra o
imperialismo (em particular contra o Japão); e que Leon Trotsky, assassinado
por um agente stalinista no México dois anos antes, tinha um “duplo padrão”
para discutir (a sempre tensa) relação entre arte e política. Dizia Mao: “Opor-se
a esta subordinação (a dos artistas ao partido) conduzirá, com certeza, ao
dualismo ou pluralismo, ou seja, em sua essência, ao que defendia Trotsky: Na
política: marxista, na arte, burguês”.
Com esta manipulação (ou “dirigismo”) na arte fica claro que Mao propôs (e impulsionou) um “utilitarismo revolucionário proletário”(?) que reivindicou, lamentavelmente, o célebre “realismo socialista” de tipo stalinista, que disciplinou os artistas e atacou a política de Trotsky.
Com esta manipulação (ou “dirigismo”) na arte fica claro que Mao propôs (e impulsionou) um “utilitarismo revolucionário proletário”(?) que reivindicou, lamentavelmente, o célebre “realismo socialista” de tipo stalinista, que disciplinou os artistas e atacou a política de Trotsky.
Discutindo contra uma suposta “cultura
e arte proletária”, a respeito de que no período pós-revolucionário na Rússia
não somente os operários faziam arte, mas também todo tipo de “escolas” e
correntes de artistas, tanto “vanguardistas” como “tradicionais”, Trotsky diz: “Quer
dizer que o partido, contrariamente a seus princípios, tem uma posição eclética
no terreno artístico? Esta ideia, que parece tão convincente, é
extraordinariamente pueril. O marxismo pode servir para valorar o
desenvolvimento da nova arte, estudar a suas fontes, valorizar as tendências progressistas
por meio da crítica, mas não se pode exigir mais do que isso. A arte deve abrir
seu próprio caminho. Seus métodos não são os do marxismo. O partido dirige o
proletariado, mas não dirige o processo histórico. Há terrenos em que dirige de
modo direto e imperativo. Há outros em que vigia e fomenta. E outros,
finalmente, em que se limita a dar diretrizes. A arte não é uma matéria na qual
o partido deva dar ordens”.
Em definitivo, Trotsky sabia distinguir, por um lado, na dialética do desenvolvimento histórico das classes, a ascensão da burguesia,
que através de três séculos se impôs via um imponente avanço material e
espiritual (na economia e na ciência, na filosofia e na arte) contra o obscurantismo
feudal da ascensão, por outro lado, da classe trabalhadora. Esta
deve, com prioridade, alcançar o poder político (por meio da estratégia e das
táticas políticas do marxismo), para, a partir dali, revolucionar as relações econômicas
(e sociais); e logo, depois de um período de assimilação da arte e da cultura
do passado, abrir um novo período de florescimento artístico, agora sem
conotação de classe: uma arte social (“universal” se quisermos), que todos/as
possam criar e desfrutar livremente. Nas palavras de Trotsky: “O partido
defende os interesses históricos da classe trabalhadora em seu conjunto.
Prepara o terreno conscientemente, passo a passo, para uma nova cultura, e
nesse sentido, para uma nova arte”; e esta surgirá, depois da tomada do poder
político, por meio da liberdade de tendências e correntes artísticas, depois de
um período de transição e consolidação da revolução operária (e da paulatina
extinção do Estado), não somente na escala nacional, mas também internacional.
Em definitivo, a política de Mao
condicionou (ou diretamente eliminou) a liberdade dos artistas no marco de um
regime burocrático onde o Estado operário carecia de democracia de massas,
soviética. A política do escritor Mo Yan foi (e é) funcional a burocracia
restauradora do capitalismo na China. E a política de Trotsky se mantem
vigente: é a que melhor soube captar os anseios, as experiências passadas e a
poderosa perspectiva do socialismo e do comunismo de maneira autenticamente
revolucionária. Esta política, que ele manteve consequentemente até sua morte,
foi o que levou a confluir com o fundador do surrealismo, André Breton, e a
propor, no Manifesto por uma arte
revolucionária independente, assinado também pelo artista Diego Rivera, na
obscura noite do stalinismo e do nazismo, pouco antes de começar uma nova guerra
imperialista-Segunda Guerra Mundial- a necessidade de uma plena independência da
arte, para a revolução; e a revolução para conquistar a liberdade definitiva da
arte.
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