sábado, 8 de dezembro de 2012

O JULGAMENTO DO MENSALÃO E A ORGANIZAÇÃO “CONSULTA POPULAR”.


POLÊMICA COM A ORGANIZAÇÃO “CONSULTA POPULAR” (PARTE I)

O JULGAMENTO DO MENSALÃO E A ORGANIZAÇÃO “CONSULTA POPULAR”.



A “Consulta Popular”, organização política cuja maioria dos quadros é oriunda do PT, compõe o setor majoritário da Coordenação Nacional do MST e impulsiona o “Levante” Popular da Juventude, agrupação que ganhou notoriedade nos últimos meses com a realização de alguns atos “escrachos” contra figuras ligadas ao regime militar brasileiro. Além disso, a Consulta Popular, nas universidades em que atua, anima alguns grupos de extensão (como na UNESP Franca) e frequentemente disputa as entidades estudantis, como foi a “Universidade em Movimento”, chapa que há alguns anos, sem obter sucesso até o momento, vem concorrendo às eleições para o DCE da USP.
Mesmo com o forte peso nos movimentos sociais e grande influência no movimento estudantil a direção da Consulta Popular, que frequentemente faz discursos sobre a necessidade de construir “novas práticas” no movimento estudantil, sindical e popular, não está disposta, como vimos nas últimas eleições (onde apoiaram Haddad e Maluf), a construir uma alternativa classista e independente ao petismo/lulismo que, como sabemos, não proporcionou qualquer avanço na reforma agrária, mantem uma política de criminalização dos movimentos sociais e favorece as grandes construtoras e empresas que fazem uso de trabalho terceirizado e precarizado. Pelo contrário, a Consulta Popular, surpreendendo até mesmo setores que já militam próximos a esse grupo e reproduzindo o discurso reacionário da direção do PT, divulgou em sua página na internet (http://www.consultapopular.org.br/noticia/ap-470-do-stf-consulta-popular-denuncia-manifesta-e-convoca) que irá realizar uma campanha nacional contra o julgamento do Mensalão no STF e em defesa dos petistas condenados por corrupção.
Ou seja, a Consulta Popular, atuando como uma espécie de “braço ilegal” do petismo oficial, se cala diante do fracasso da política agrária do governo Dilma, não diz nada sobre a repressão do governo federal contra os operários das obras das usinas de Jirau e Belo Monte, mas está a postos para pular na lama e ajudar a lavar a cara do petismo que está imerso na imensa sujeira que se tornou a política parlamentar no Brasil.
Diante de um fato como esse, que traz enormes prejuízos para aqueles que ainda lutam por uma alternativa independente, não é apenas importante, mas inclusive salutar que aqueles que se reivindicam como parte do marxismo revolucionário coloquem de forma clara suas ideias, debatam e façam as devidas polêmicas para ajudar a classe trabalhadora e os grupos oprimidos a clarificar suas posições, separar aliados dos inimigos e reconstruir um polo classista e combativo que coloque o proletariado de volta na cena política nacional e internacional. Desse modo, não podemos concordar, como vocifera alguns setores da esquerda que há muito tempo deixaram as fileiras do marxismo revolucionário e cada vez mais se enveredam pelos caminhos dos métodos stalinistas e semi-reformistas, com as posições que alardeiam e condenam o debate dentro da própria esquerda. Suprimir a polêmica política e teórica é algo que caminha na contramão das principais lições dos grandes revolucionários do passado como Lenin, Rosa Luxemburgo e Trotsky. Nesse sentido, buscando auxiliar no avanço da consciência de classe do proletariado para que este, como sujeito social, hegemonize o conjunto das classes subalternas e apresente uma alternativa à barbárie capitalista e a seus prejuízos racistas, homofóbicos e machistas iremos questionar a posição equivocada da Consulta Popular e indicar como essa organização, com sua política de “seguidismo” ao petismo, lamentavelmente não representa uma alternativa para construir um movimento operário classista e um movimento estudantil combativo.

JUDICIÁRIO, MENSALÃO E A CONSULTA POPULAR.
Décadas de Monarquia, ditaduras e alguns poucos anos de tímidos e degradados regimes democráticos dirigidos por uma burguesia antinacional, subserviente e semicolonial fez com que o Brasil mantivesse uma estrutura político-parlamentar falida e corrupta que, frequentemente, por desavenças entre os próprios grupos e partidos dominantes, vem à tona para o conjunto da população. As campanhas dos principais partidos do regime, como é caso do PT e PSDB, são financiadas por grupos financeiros, construtoras e grandes empresas que posteriormente serão os únicos beneficiados. Não por outro motivo, todos os partidos com representação na Câmara dos Deputados estão, por alguma razão, envolvidos em esquemas de corrupção – até mesmo o PSOL. Em que pese diferenças de gestões, defender que o PT, que há anos aprofundou sua ligação orgânica com o regime burguês e estreitou seus laços com os países imperialistas, seja menos corrupto do que os privatizadores tucanos é, definitivamente, comparar seis com meia dúzia. Advogar que o partido de Lula, que recebeu cerca de 60 milhões de doações de grandes empresas para sua campanha em 2012, é vítima da direita e da imprensa golpista, como faz a Consulta, é esquizofrenia ou oportunismo.



Para os marxistas revolucionários o parlamento burguês, como já está demonstrado historicamente, é um espaço onde a classe dominante conspira contra os interesses do povo. Mesmo assim, atuamos taticamente nesse espaço utilizando a tribuna para denunciar as armadilhas dos representantes da burguesia, denunciar os ataques que estes estão preparando e convocar amplamente os trabalhadores para a luta nas fábricas, campos e ruas com seus próprios métodos de luta. Contra o oportunismo apressado que levanta a impossibilidade de tal atuação, a intervenção dos deputados ceramistas – dois operários da fabrica Zanon- da Frente de Esquerda e dos Trabalhadores, na Argentina, mostra que é possível uma atuação não adaptada e classista no parlamento burguês.
Também deixamos claro que o judiciário, em que pese o enorme esforço da imprensa burguesa brasileira em torná-lo o guardião da ética e da moralidade, é uma instituição também voltada aos interesses dos ricos. Com raríssimas exceções, os juízes e desembargadores, sob a máscara de decisões técnicas e imparciais, trabalham contra os interesses dos mais pobres e acobertam os crimes do colarinho branco. O Supremo Tribunal Federal (STF), órgão de cúpula do judiciário, não foge à regra. Trata-se de uma instituição reacionária, mesmo tendo em sua composição uma maioria de ministros indicados pelos governos do PT, que faz um trabalho sujo para os partidos da oposição burguesa (PSDB, DEM e PPS) e para alguns grupos econômicos não alinhados com o governo federal.
Contudo, a Consulta popular, num misto de ingenuidade e oportunismo, proclama em seu manifesto:
“A Consulta Popular manifesta que a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal arrogou-se o papel de escolher, por suas próprias opções políticas, as correntes de opinião que devam ter a possibilidade de exercer os poderes Executivo e Legislativo no Brasil, consumando a um só tempo os processos de judicialização da política e politização do judiciário.”
A ingenuidade fica por conta do descobrimento tardio de que há uma politização do judiciário. O oportunismo fica evidenciado na omissão de que o PT é um dos principais agentes e mantenedores desse mesmo sistema político/jurídico que garante a impunidade aos crimes da burguesia e reserva o sistema criminal e carcerário aos pobres e àqueles que lutam pelos direitos da classe trabalhadora e do povo em geral. A inabilidade do PT em evitar um revés como o julgamento do Mensalão não pode ser traduzida como uma perseguição, mas sim como uma batalha perdida na incessante guerra entre frações da burguesia que disputam a hegemonia no controle do poder constituído.
Seria cômico se não fosse trágico, mas no Brasil da “Consulta Popular”, o PT que governa há 10 anos o país junto a importantes monopólios econômicos e financeiros, envolvido em inúmeros esquemas sujos para garantir a governabilidade, é mais uma vítima da direita.



Segundo os dirigentes e ideólogos da Consulta o julgamento do mensalão significa um retrocesso e um enfraquecimento do bloco progressivo e democrático e, por isso mesmo, deve ser questionado. Entretanto, ainda que omitamos os argumentos que apontamos a cima que mostram o contrassenso dessa posição, veremos como há inúmeras questões na realidade nacional que corroboram para o enfraquecimento do campo progressivo, dos direitos humanos e da esquerda e que mereciam uma grande atenção, mas que a Consulta Popular, em nome da eterna defesa dos “mensaleiros” petistas, não coloca como prioridade ou simplesmente se omite.

A CONSULTA POPULAR ALHEIA AOS PRINCIPAIS COMBATES PELOS DIREITOS DEMOCRÁTICOS.
A posição da “Consulta Popular” por si própria já é extremamente equivocada e nem um pouco educativa para a vanguarda dos trabalhadores, mas é um fato inegável que, diante da conjuntura atual do país, em especial do Estado de São Paulo onde há uma verdadeira política de extermínio contra o povo pobre e negro das comunidades levado a cabo pelo governo tucano, a posição da Consulta ganha contornos ainda mais problemáticos.
Os estudantes, trabalhadores e jovens em geral que se indignam diante da política de genocídio da PM e do PSDB contra os pobres de São Paulo deveriam perguntar por que a Consulta Popular, que como apontamos a cima tem uma grande responsabilidade em inúmeros movimentos sociais e populares de massas, não deu qualquer peso para a luta contra a violência policial que atingiu níveis estratosféricos?
Nas páginas do jornal Brasil de Fato, periódico editado pela Consulta popular e movimentos ligados a esta, assim como em sua página na internet, há mais informações quanto a supostas nulidades processuais do processo do mensalão (até aqui nenhum problema) do que uma denuncia e campanhas contra o massacre policial contra os pobres em São Paulo. A tarefa de denunciar a política higienista Do governo paulista e as propostas reacionárias contra a criminalidade (redução da maioridade penal, mais ROTA na rua e penas mais severas) não seria uma tarefa elementar daqueles que buscam fortalecer o campo progressivo? A defesa dos trabalhadores precarizados que têm seus bairros sitiados pela polícia paulista não ganha mais destaque do que a defesa de algumas figuras petistas envolvidas com banqueiros e compra de voto para aprovar a privatista reforma da previdência? Ao que parece nada disso sensibiliza a direção da Consulta, que elegeu o PT como a principal vítima da direita e sua defesa como a campanha nacional prioritária.



Nem mesmo os dados lançados na última semana sobre a política de reforma agrária do governo, que demonstram um retrocesso sem precedentes nessa questão, são suficientes para acelerar o rompimento da Consulta com o Governo. O conservador jornal o Estado de São Paulo, sem esconder sua gratidão, comentou os dados da seguinte maneira:
“Os dados mais recentes sobre o número de famílias assentadas em terras desapropriadas para fins de reforma agrária confirmam uma notável mudança na política agrária do governo do PT depois da posse de Dilma Rousseff na Presidência da República. Resistindo às ameaças e às pressões do Movimento dos Sem-Terra (MST) e de áreas do partido ligadas historicamente à reforma agrária, o atual governo vem reduzindo drasticamente o número de famílias assentadas. Neste ano, até o dia 16 de novembro, de acordo com registros do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, 10.815 famílias tinham sido assentadas, como mostrou reportagem de Roldão Arruda no Estado (19/11). Esse número indica que o total deste ano deverá ser menor do que o de 2011, de 20,8 mil assentamentos, que, até agora, era o menor desde 1995.”
Os vergonhosos números da reforma agrária, que evidenciam que o PT governa para o latifúndio, não seriam motivos justos para uma campanha nacional em defesa da reforma agrária e de denuncia do governo Dilma? Não para a Consulta. A defesa dos “mensaleiros” também se sobrepõe a luta pelo acesso a terra aos camponeses pobres e trabalhadores rurais.
Como vimos, a “Consulta Popular” comete inúmeros equívocos. Além de fazer o malabarismo político-ideológico de transformar o PT, partido número um da ordem, em um partido de esquerda e vítima da direita, levanta a defesa dos petistas se omitindo dos principais combates democráticos da atual conjuntura. Secundariza a luta pela reforma agrária e pelos direitos humanos em São Paulo e coloca a defesa dos mensaleiros em detrimento das primeiras.



Como marxistas revolucionários, ou seja, trotskistas, não temos nenhum interesse que a situação nacional gire à direita. Não queremos o fortalecimento da oposição de Direita e de seus jornais conservadores. Entretanto, não temos nenhuma ilusão de que isso signifique um apoio ao PT. Como demonstramos antes, a problemática da corrupção está intrinsecamente ligada ao regime burguês e ao sistema capitalista. O PT, assim como PSDB, são os principais agentes mantenedores dessa ordem. É preciso questionar o regime de conjunto e não atuar com uma das alas da burguesia, sob o pretexto de um suposto “mal menor”, para combater a fração mais conservadora do bloco burguês. A construção de uma alternativa independente das frações burguesas, um polo classista, combativo e antiburocrático, é condição sine qua non para o fortalecimento das organizações operárias e populares e ao combate às entidades patronais e da direita. Ao que parece a Consulta Popular abriu mão de uma política independente. Numa próxima oportunidade mostraremos como esses problemas estão diretamente relacionados com a estratégia escolhida pela Consulta Popular.






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